Em janeiro de 1967 a edição de número 10 da revista REALIDADE é apreendida em São Paulo e no Rio de Janeiro. Tratava-se da Edição Especial: A mulher brasileira hoje. “Tudo nesta edição – desde as cartas até o ‘Brasil Pergunta’ – trata de mulheres. Trabalhando, amando, rezando, pensando, falando… sendo” escreveu Roberto Civita, então diretor de redação da revista REALIDADE, da Editora Abril. De lá para cá já são três edições sobre a mulher, sendo a segunda em 1994 e a última em junho de 2010.
Essa breve introdução é uma leve provocação para aguçar a curiosidade intelectual dos leitores para que busquem saber mais sobre o conteúdo das três edições, com o objetivo principal de observar o caminho percorrido, até então, pelas mulheres em toda a história da humanidade nos campos: social, político e econômico. Caminho esse em permanente construção, e por que não dizer: a ser desbravado a cada dia.
Tantas conquistas, avanços e constantes desafios levou naturalmente a entrada das mulheres no mundo dos negócios. Seja como funcionárias, seja como donas do seu próprio negócio.
Nesse contexto, a edição VEJA Especial MULHER de junho de 2010 ouviu 1.000 mulheres das classes A, B, C com mais de 18 anos em dez cidades brasileiras, sendo uma representação de 9,3 milhões de brasileiras. Pergunta: a mulher consegue ter o mesmo êxito que o homem no trabalho? 80% das entrevistadas responderam que sim. Comentário registrado: o direito ao emprego, nas mesmas condições masculinas, e com certeza de sucesso, é uma das conquistas definitivas de nosso tempo.
No Brasil, estudos do SEBRAE e do GEM – Global Entrepreneurship Monitor aponta que no período de 2002-2010 pela primeira vez 52,4% dos novos negócios estão no controle de mãos femininas. O Brasil se encontra na quarta posição do ranking mundial de empreendedoras, composto por 54 países conforme pesquisa GEM realizada em 2011, com 7,7 milhões de mulheres à frente de negócios em nosso país. (Fonte: Sebrae/GEM – 2011)
Segundo as pesquisas realizadas pelo GEM e também pelo Sistema SEBRAE, há aproximadamente 10 anos o empreendedorismo no Brasil passou de “por necessidade” para “por oportunidade”. Nesse sentido a entrada da mulher no mundo dos negócios deixou de ser uma atividade informal, tímida, realizada, na maioria dos casos, em casa para ajudar nas despesas da família, para ser uma atividade formal, uma profissão, uma realização pessoal.
Essa empreendedora investe tempo na busca por informações, na elaboração de um plano de negócios, em rede de contatos com outras empreendedoras, em sua formação. No mundo dos negócios, conforme dados do SEBRAE, as empreendedoras possuem maior grau de escolaridade: 18% das mulheres tem superior incompleto ou mais, enquanto os homens ficam com 11% nessa mesma equação.
E onde estão as empreendedoras, em quais segmentos da economia? As mulheres empreendedoras tem uma presença maior nos setores de serviços e comércio; enquanto os homens se concentram na indústria, destaque para a construção civil e no agronegócio.
No contexto sul-mato-grossense das mais de sete milhões de empreendedoras brasileiras, temos 103 mil, o que representa 1,5% do total do país; 94% dessas são sócias-proprietárias, 57% declaram possuir ou ter iniciado ensino superior, especialização e/ou doutorado, e 51% possuem entre 40 e 60 anos de idade (Dados pesquisa Sebrae/MS com base no PSMN – 2008/2011 e PNAD – 2011). Entre essas empreendedoras, 523 já participaram do Prêmio SEBRAE Mulher de Negócios, sendo que o Estado de Mato Grosso do Sul, já obteve quatro vezes o terceiro lugar na etapa nacional, cinco vezes o segundo lugar, e já foi agraciado com o primeiro lugar por uma vez.
Em todo esse cenário extremamente promissor, um dado ainda precisa ser trabalhado de forma mais igualitária e requer atenção: o rendimento médio mensal. Conforme dados do PNAD 2011 (IBGE) enquanto entre as mulheres esse rendimento é de 2,2 salários mínimos, para os homens ele fica em 3,2. O rendimento médio mensal das empreendedoras é 31% inferior ao dos homens. Esses números demonstram que ainda há muito que fazer para uma atuação e reconhecimento mais igualitário, equilibrado e consequentemente mais justo.
Mas a liderança feminina vai muito além do mundo dos negócios. A última eleição no Brasil, com duas candidatas à Presidência da República, o aumento ainda que tímido da mulher em todos os cargos do Executivo, Legislativo e Judiciário, os postos assumidos em grandes corporações como a Petrobras, a legião de executivas espalhadas em todo o Brasil nos mais diversos segmentos e cargos, lideranças comunitárias, atuação em destaque em várias frentes voltadas à assistência social e à inclusão social. Isso demonstra que a mulher está sendo, como disse Civita, explorando, exercendo e aplicando seu potencial. Contribuindo de forma plena, produtiva e eficaz para um mundo melhor.
Entre as principais características dessas empreendedoras estão: uma abordagem mais humanista em toda sua atuação, visão sistêmica, persistência e paciência nas negociações, habilidade multitarefa, preocupação com o ambiente social, econômico e político, atenção e agregação de valor através da cultura regional, espírito de cooperação, contribuição para a formação e desenvolvimento de outras empreendedoras.
Sim, é a mulher ocupando um espaço, de forma sábia, complementar e interdependente com homens e outras mulheres. Um espaço que estava vazio a espera dessa multidão de empreendedoras, em todo o mundo, que mais que mulheres, são seres humanos.
http://www.gemconsortium.org/teams/11/brazil
http://www.gemconsortium.org/docs/download/2806
http://www.sebrae.com.br
Maristela de Oliveira França
Economista, mestra em Desenvolvimento Local, Diretora de Operações do Sebrae/MS.
Fevereiro/2014