É a alma e o corpo. É um sonho bem-vindo.
Lembro-me de quando decidi assumir de vez a vendinha da família, em 1978. A ideia de ter o meu próprio negócio soava como música para meus ouvidos. Mas, como muitos brasileiros, o sonho que eu tinha há alguns anos só se tornou realidade graças a uma palavra mágica responsável por mover montanhas: necessidade.
A venda de artigos pra casa, de porta em porta, já não me rendia mais como antes; e a empresa que eu representava decidiu focar em buscar espaço nas prateleiras de grandes magazines. Logo, fui convidado a ir pra rua sem produtos e sem emprego, se é que me entende. Pensei: por que não dar um descanso aos meus pais que já estão exaustos de tanto trabalhar? Agarrei a oportunidade. Uni o útil ao agradável.
Aliás, mais ou menos agradável. Convencer meu pai foi a parte mais difícil. Difícil não, impossível. Isso mesmo…convencer meu pai a voltar da praia dois meses depois de ter aceito minha proposta não deu certo. O véio gostou tanto da ideia de se aposentar que não quis nem saber de me ajudar a segurar uns rojões e relembrar dos tempos em que suava longe da areia e da água de coco. “Se vira, juvenil. Passei por isso por décadas enquanto você brincava tranquilo. Morrer não vai. No máximo, perder cabelo”.
Não desisti e, mesmo cambaleando, superei os obstáculos mais assustadores, como crianças barrigudinhas com caras irresistíveis de coitadas que faziam com que eu aceitasse receber somente dias depois da venda. “Fiado só pra maiores de 80 anos acompanhados dos pais”, ensinou meu pai em uma “consultoria” exclusiva, já bem bronzeado e humorado, típico de quem está em férias pra sempre.
Após esse puxão de orelha, eu só corria riscos de forma calculada, ou seja, pedindo algo de valor penhorado até que me pagassem; como por exemplo: carrinho de rolimã, pião, pipa, joão-bobo (e isso sempre funcionava pra reduzir a inadimplência).
Então, encorajado pelas palavras da minha mãe, que disse com sua voz doce “Larga de ser um inútil borrão e cria coragem”, investi o resto de minhas economias para modernizar a vendinha, com qualidade, e contratar o maior fofoqueiro do bairro para espalhar as novidades.
Funcionou e a partir daí a coisa engrenou; viramos um mercadinho de primeira. Com comprometimento, pouco a pouco evoluí. Mas não posso relaxar (só depois de alguns anos, que eu herdar a cadeira de praia e a sombrinha dos véios mais véios que eu). Sempre temos novos desafios nos negócios e, pra ajudar, busco informações, planejo, estabeleço metas, mantenho contatos com fornecedores e clientes.
Como todo empreendedor e empreendedora, eu mato um leão por dia. Mas, no final desse mesmo dia, de muitas horas de trabalho, vejo na família um conforto. Coloco a cabeça no travesseiro com a certeza de vitória e de que este é o caminho certo que escolhi pra mim. Dono do meu próprio negócio, chefe da minha jornada. Guerreiro como o sul-mato-grossense, assoviando e chupando cana ao mesmo tempo; laçando um boi com uma mão e segurando a guampa do tereré com a outra.
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Seu Brae
Dono do melhor mercadinho do bairro.
Especialista em resenha com o cliente.